sexta-feira, maio 29, 2009

Lute Music for Witches and Alchemists – Música de alaúde para bruxas e alquimistas


A primeira coisa que me atraiu nesse álbum, gravado por Lutz Kirchhof, foi o seu título bastante interessante e que logo despertou minha curiosidade. Trazendo composições de autores dos séculos XVI até o XVIII, as gravações e o libreto do disco nos dão uma ideia da multiplicidade de usos e crenças que envolviam esse misterioso instrumento, hoje muito raro de ser escutado. Assim, apresentam-se músicas para dança, para meditação, para a cura contra picadas de tarântula, além de composições ligadas aos quatro elementos, bem como da misteriosa quintessência. Reproduzo abaixo, uma tradução minha do libreto que acompanha o disco, com texto original em inglês.


Esta gravação nos leva para mundos em parte bem estranhos a nossa consciência moderna. No tempo em que essa música foi composta, a percepção humana dos tenebrosos recônditos da alma e das nobres alturas de um luminoso mundo mitológico dos espíritos ainda não havia se tornado obscurecida pelo poder do pensamento racional. As atividades dos alquimistas incluíam o confrontamento de seu eu essencial em um processo de meditação, a fase primária do que eles chamavam nigredo, uma “escuridão mais escura que a escuridão”. E uma dessas técnicas de bruxaria envolvia o uso da música e da dança, para estimular as forças da vida, em uma atmosfera que era congenial, mas ao mesmo tempo misteriosa e onírica.

Isso é de grande importância quando nos aventuramos nessas regiões remotas de fantásticas experiências. O melhor jeito de fazê-lo é ouvir repetidamente os trabalhos musicais que nos tocam como algo particularmente sobrenatural, de modo a ganharmos acesso a suas qualidades atemporais. Esse processo pode revelar que danças, fantasias, prelúdios etc., eram concebidos para atuar mais sobre o nível do sonho do que sobre um cientificamente racional ou analítico. É possível entrar em um leve “corpo imaginário”, no qual se ouve e se sente a música – e talvez a dance em acompanhamento.


O mundo do alaúde – A Atlantis musical

Era uma vez um instrumento que – embora tenha sido o instrumento mais importante da Europa por muitos séculos –, da mesma forma que a enigmática cidade de Atlantis, que subitamente afundou no mar com todas suas riquezas e preciosos tesouros, caiu no esquecimento juntamente com toda sua maravilhosa, vital e romântica música: o alaúde.

Nos períodos da Renascença e do Barroco, o som do alaúde deve ter sido quase tão onipresente quanto a música emitida por grandes ou pequenos alto falantes, hoje em dia. Nas ruas, nas cortes, durante as viagens, em câmaras, estalagens e igrejas, nos barbeiros, nas festividades, no banho, a céu aberto, nos encontros secretos dos amantes, no laboratório dos alquimistas... a música do alaúde era ouvida em todos os lugares.

O que era essa música, que tinha tão poderoso efeito e que era tão onipresente?

Acredita-se que os sons delicados e místicos do alaúde poderiam perscrutar “le secret des muses” - o segredo das musas. A música do alaúde penetrava profundamente nos níveis ocultos da consciência. Ela envolvia seus ouvintes em sentimentos de exuberância e melancolia, doçura e simplicidade, de sonho e florescimento erótico; sentimentos de sofrimento, do êxtase e da desilusão amorosa, da alegria ruidosa, da ironia e da seriedade mortal. Ela os transportava para as profundezas desconhecidas da alma. As emoções entorpecidas pela lúgubre, monótona e maçante rotina diária recebiam uma nova e distinta moldura através dessa música. Dela, dizia-se que curava o corpo “através da alma”.

Então, o alaúde foi esquecido. As pessoas gradualmente perderam sua sensibilidade aos seus finos, delicados e melancólicos sons e voltaram-se cada vez mais para o som monumental da grande orquestra, vindo a preferir continuamente os instrumentos mais potentes. A altamente civilizada e refinada arte de tocar alaúde morreu.

Por fim, nós começamos a redescobrir essa Atlantis musical. Bibliotecas e coleções contém um vasto tesouro da música para alaúde. É provável que nenhum outro instrumento musical possua tão enorme repertório – e compositores modernos estão começando novamente a mostrar interesse nesse instrumento. A qualidade pacífica e equilibrada da delicada música dessa “rainha dos instrumentos musicais” é eterna – ainda hoje, ela tem o poder de nos comover.


A força mágica da antiga música para alaúde

Se nós quisermos entender a Atlantis musical encorporada na antiga arte europeia de tocar alaúde, devemos ir além das técnicas de execução e construção dos instrumentos, das várias formas de tablaturas e das regras de ornamentação. O segredo mais profundo e fundamental é a intenção musical – o mundo espiritual – subjacente às representações escritas. Uma busca por linhas mestras revela citações como a seguinte:


Um alaudista pode conseguir qualquer coisa com seu instrumento. Ele tem influência, por exemplo, sobre as formas geométricas, do quadrado ao círculo; estabelece as relações entre uma estrela e outra e determina a velocidade dos corpos que caem – tudo isso pode ser feito e milhares de outras coisas mais. (Pater Mersene, Harmonie Universelle, 1636)


Essa pretensão parece um pouco ingênua para a mente moderna. A investigação do contexto nos conduz a pensadores da época, tais como Johannes Kepler, Athanasius Kircher e Robert Fludd, que eram mentalmente familiarizados e conscientes de cada uma das outras descobertas científicas. O principal trabalho de Kepler concerne à harmonia das esferas, como descrita pelos pitagóricos. Ele mostra que estas leis são onipresentes na natureza, no universo, no ser físico e espiritual do homem e na música – referindo-se a descoberta de estruturas idênticas na geometria, astronomia, biologia, música e outros campos do conhecimento. Estruturas musicais análogas às formas geométricas (o círculo) e fenômenos astronômicos (os caminhos dos corpos celestes) podem ser representadas no alaúde, e também é possível, por meios de modulação e outros dispositivos, produzir uma analogia musical da quadratura do circulo.

Desde que, como descreve Kepler, a alma do homem entende e reage instintivamente a tais estruturas em virtude de sua natureza divina, deve ser também possível o uso dessas para transformar a consciência humana por meios alquímicos. A descrição de Thomas Mace de uma experiência de iluminação reprodutível através do correto manuseio do alaúde, provém ainda outra peça ao quebra-cabeças. (Musickes Monument, 1676).

Bruxas (witches – um termo que originalmente era aplicado a mulheres dotadas de sabedoria e versadas nas artes da medicina e do manuseio de ervas) também usavam a música para fins medicinais. Uma gravura de De Lancre (O Sabbath das bruxas, 1613) mostra um grupo de bruxas fazendo música, cuja figura central está tocando um alaúde. Seguindo as tradições ancestrais, essas mulheres sábias usavam a música, a dança e outros meios para estimular, em seus pacientes, as forças da vida. A harmonia cósmica, visivelmente refletida nas proporções físicas do homem, tem suas contrapartidas acústicas na antiga música europeia; os efeitos físicos e espirituais que eram usados para acalmar e reassegurar os pacientes, e para produzir neles estados de êxtase, terror ou felicidade.

Em O templo da música (De templo musicae, Oppenheim, 1617), de Robert Fludd, numa apresentação simbólica, feita em forma de tabela, o alaúde é representado como instrumento musical mais importante. A sutileza e as finas nuances tonais que caracterizam o alaúde e sua música indicam que a arte de sua execução era parcialmente dirigida para as práticas meditativas e mesmo mágicas. Todas as civilizações avançadas do mundo fazem menção a percepção progressivamente elevada e a estados de consciência que resultam de exercícios intensivos de meditação e contemplação. As parábolas do Zen Budismo, por exemplo, contém paralelos às ideias que são irracionais em termos de um pensamento lógico (tais como a quadratura do círculo).

Estes são apenas alguns dos muitos pontos que indicam que a música de alaúde também era usada para fins mágicos. Nossa gravação introduz vários tipos de música para alaúde e pretende criar uma noção de como a música pode ser usada para influenciar nossos seres intelectuais, espirituais e físicos.

quinta-feira, maio 28, 2009

Phantasystem e Cris Rissatto

Esta é a apresentação do Phantasystem com a Cris Rissato, durante OXOUZINE, sobre a qual eu falei no post Como fazer arte no século XXI?




segunda-feira, maio 25, 2009

Anekdote/Anedota

Coloco aqui no meu blog também algumas tentativas de tradução. Essa é de uma anedota escrita por Heinrich von Kleist (1777-1811).

Anekdote

Ein Kapuziner begleitete einen Schwaben bei sehr regnichtem Wetter zum Galgen. Der Verurteilte klagte unterwegs mehrmal zu Gott, daß er, bei so schlechtem und unfreundlichem Wetter, einen so sauren Gang tun müsse. Der Kapuziner wollte ihn christlich trösten und sagte: du Lump, was klagst du viel, du brauchst doch bloß hinzugehen, ich aber muß, bei diesem Wetter, wieder zurück, denselben Weg. – Wer es empfunden hat, wie öde einem, auch selbst an einem schönen Tage, der Rückweg vom Richtplatz wird, der wird den Ausspruch des Kapuziners nicht so dumm finden.


Anedota

Um capuchinho acompanhava um suábio para a forca, sob um tempo muito chuvoso. O condenado reclamava a Deus repetidas vezes pelo caminho, que ele, sob um tempo tão ruim e hostil, deveria percorrer um caminho tão amargo. O capuchinho queria consolá-lo de maneira cristã e disse: Seu patife, por que reclama tanto? Você só precisa percorrer o caminho de ida. Mas eu, sob esse tempo, tenho que voltar pelo mesmo caminho. - Quem considerar, como o caminho de volta era desolado, mesmo em um dia bonito, não achará o comentário do capuchinho tão idiota.

quarta-feira, maio 20, 2009

Como fazer arte no século XXI?


Tudo começou com um evento chamado OXOUZINE, apresentado por um professor da área de língua alemã de minha universidade. Com as luzes do anfiteatro apagadas, o professor falava um pouco sobre a vida e a obra de Marcel Duchamp, de seu jeito até um tanto tímido, bem contrastante com suas ideias ousadas no campo artístico. Conhecendo razoavelmente a figura que ali na frente se postava, eu tinha certeza de que a escuridão reinante no auditório seria quase o equivalente professoral à frase “Isto não é um cachimbo”! Pois bem, aquilo não era uma aula, era “OXOUZINE”, algo diferente, que incluía dança, música eletrônica e uma montagem com vídeo. Bem, foi nesse momento, com a apresentação da “banda de um homem só” PhantaSystem, de Jônatas Protes, e com a apresentação visual de Cris Rissatto, que me ocorreu uma coisa...

Como uma súbita revelação, uma epifania – se é que isso ainda está na moda –, acho que compreendi algo de nossa contemporaneidade. É provavelmente essa “nova” música eletrônica, tão certinha se comparada aos experimentos stockenhauseanos ou às dissonâncias schoenberguianas (embora este concebesse um sistema, no qual não existisse a dissonância). Talvez não seja mais a dissonância que expresse o nosso tempo. Mas sim a repetição. Ações automatizadas. Impessoais. Artificiais. Ou até desumanas! Não há mais o toque da carne sobre uma corda, ou o sopro que sai de dentro de si para soar através de um instrumento por toda uma sala e, quem sabe, atingir algo além dos ouvidos. É a expressão do ritmo das cidades grandes, com seus altos edifícios e suas janelas padronizadas. Um ritmo de concreto que se sobrepõe ao homem, ao mesmo tempo que mostra o seu poder de se erguer cada vez mais alto. Esse ritmo pode ser, talvez, um tanto monótono. Mas quanto nos atrai? Não excita algo de mais primitivo que convida todos os homens a uma mesma dança, em uma espécie de comunhão que procura, por um momento, suspender as artificialidades das relações cotidianas? Há, realmente, algo de paradoxal nisso tudo. A expressão de nosso tempo, não pode ser outra coisa senão paradoxal.

Exatamente uma semana depois fui assistir ao filme Eu não estou lá (I'm not there), a pseudo-biografia do cantor e compositor americano Bob Dylan. Não posso dizer que sou fã desse famoso músico, mas algo me chamou a atenção. Sua infância, do modo como foi retratado no filme, era a de um jovem com seu violão, do tipo que viaja por sua própria conta, algo entre o vagabundo e o respeitável. Desde cedo, bastante inteligente, o pequeno Bob falava da um mundo de viagens de trens, músicos ambulantes como ele etc. Até que um dia lhe dizem: “Hei, filho! Você está em 1959, fale sobre o seu próprio tempo!” O garoto aceita a ideia e dá início às suas canções de protesto, compostas sobre o ritmo popular, ou folk, talvez mantendo-se, em termos estritamente musicais, ainda sobre uma plataforma mais antiga. A essas canções, deram o nome de “canções com o dedo em riste”, ou seja, uma crítica, uma provocação. Posteriormente, o cantor abandona esse modo de fazer música e é, de certa forma, perseguido, como se agora o mundo não lhe interessasse, estivesse alienado.

Pois bem. Dois eventos, duas histórias e uma mesma questão? Como falar do seu próprio tempo? Ou contra ele? Essa questão me atingiu em cheio! Logo eu que recentemente havia escrito sobre o encantamento que me foi provocado ao ouvir músicas de Mozart tocadas ao clavicórdio?

Foi a questão do meu gosto que talvez me levou à maior perplexidade. A cada momento ressuscitando Bach, Weiss ou Quantz, realmente, senti-me desencaixado. Ou será que não? Não queria falar que os gênios são eternos ou algo assim; mas a fuga da repetição, do concreto, do padrão, do som artificial, enfim, a demonstração de desagrado com esse mundo não é também uma demonstração do que somos e de nosso tempo?

Termino esse texto sem respostas.

domingo, maio 17, 2009

A experiência de ler - An experiment in criticism


Lembro-me bem de minha chegada à Faculdade de Letras. Conforme o programa, a primeira aula seria de Teoria da Literatura I. Eu particularmente nutria grandes expectativas em torno dessa matéria: a discussão da arte em um grande âmbito; o alargamento dos horizontes em relação àquela literatura que se aprende na escola, tão antiga, fechada sempre nos mesmos nomes de autores, as mesmíssimas obras, que, aparentemente, já há uma ou duas gerações são apresentadas da mesma forma! O quanto ainda devemos nos chocar e louvar a Semana de 1922 – em um primeiro momento tão difícil de compreender – e odiar os alienados parnasianos e seus malditos vasos gregos e camartelos?

Surpreendeu-me e assustou-me a pergunta então colocada: O que é literatura? Poderia, em um primeiro momento, deduzir que a definição de literatura fosse um pressuposto básico para a construção de qualquer ciência em torno dela, mas, naquele tempo, não passavam pela minha cabeça nem o conceito nem a palavra epistemologia e o efeito dessa pergunta foi de imediato aprisionamento. O ambiente arejado e os amplos horizontes que almejava alcançar foram trancafiados por uma ladainha (entendam a palavra como quiser, inclusive no sentido litúrgico), que, obviamente, excluía boa parte daquilo que havia me levado aos livros.

A definição do termo “literatura” foi então ganhando bastante complexidade, mas não limites. Cada vez mais, por maior o esforço que fosse empregado, os limites do que se chama literatura se desfaziam, enganavam, escorregavam. A literatura tornava-se, aos poucos, uma entidade sagrada, algo tão difícil de definir quanto Deus – exceto pelo fato de que uma é passível de ser criada, enquanto o outro é o grande criador.

Mas, pergunto-me agora se não teria sido deveras mais proveitoso e honesto tentar definir o que é o crítico literário ou o trabalho da crítica em vez de se perder em questões que conduzem mais ao esoterismo que à ciência “verdadeira” - algo que se espera de uma universidade. Ah, mas sem a incerteza, talvez, as ciências humanas seriam odiosamente feias, ou menos poéticas...

Entendam, com essas observações não pretendo criar qualquer tipo de aversão ao que é costumeiramente chamado e defendido como “a grande literatura” ou simplesmente “o cânone”. Só queria expressar o meu sentimento, que não foi o de grande e imediato interesse de chegar e mergulhar nesse universo sagrado da alta literatura. Não me sentia a vontade movendo-me entre os literatos, sentia-me mais como uma pessoa humilde que é levada a um palácio e encolhe os braços, desajeitada, para não tocar em nada que lhe pareça valioso demais. Por outro lado, não estava muito disposto a aceitar essas verdades – ou dogmas – já pré-fabricadas e a considerar como a escória da humanidade aqueles que não tem acesso, ou simplesmente não se interessam, por ela, a literatura.

Um ano e meio ou dois anos depois, uma boa alma me indicou a leitura desse livro: A experiência de ler do C. S. Lewis, cujo título original, bem mais interessante, é An experiment in criticism. O texto começa analisando não o que é literatura, mas os modos como de se ler. Separa, então, aqueles que possuem uma sensibilidade especial para a literatura daqueles que não a têm, sem os hierarquizar, ressaltando, inclusive, que existem pessoas inteligentes, honestas e úteis à sociedade em geral, mas que não possuem essa sensibilidade literária. Para estes, a leitura não seria uma atividade importante em suas vidas, sendo mero passatempo ou algo para ser feito nas horas vagas. Seu interesse seria mais ligado à história contada, dando pouca atenção às palavras e ao modo como se conta. Já o outro grupo, mais sensível, consideraria a leitura algo importante em suas vidas, tendo o prazer de falar sobre ela, incluindo-a como parte de sua vida, não mero divertimento.

Contudo, mesmo esses leitores, supostamente mais sensíveis, poderiam cometer “erros” de leitura, pois a boa leitura deve ser aquela na qual o leitor procura, em um primeiro momento, esvaziar-se de suas preocupações e preconceitos e se deixa guiar pela obra. Lê de um modo positivamente “desinteressado”, receptivamente. Pois mesmo aqueles que se dizem literatos e portadores de uma grande sensibilidade, muitas vezes não leem assim. Fazem antes um uso da literatura.

Esse uso, poder-se-ia dizer (com todo o pedantismo que as mesóclises permitem), é algo como um tabu no meio universitário. Pois uma boa parte de seus alunos e professores fazem um uso da literatura. Mas como usar a literatura, algo tão complexo e tão belo exatamente por sua inutilidade? Como usar um poema? Como usar uma obra de arte? Imaginem só, como usar a “Roda de Bicicleta” do Duchamp?

Bom, no caso da literatura, pode-se fazer muitos usos. Pode-se procurar uma filosofia de vida, algo edificante, instrutivo; utilizá-la para aprender mais sobre o humano ou sobre diferentes épocas históricas; ou ainda, degluti-la de modo que, vez ou outra, a citação de um verso, a menção a uma narrativa, ou algo de um gênero, confira a pessoa um especial lustre que erga seu status social e faça com que ela seja considerada inteligente, culta, ou mesmo sábia.

O autor dá ainda umas palavras sobre a crítica literária e sua função, algo que vai se assemelhar bastante ao prefácio da Anatomia da Crítica do Northrop Frye, mas, como já me alonguei muito nesse post, deixo o assunto para outra ocasião.

De qualquer forma, recomendo A experiência de ler para aqueles que pretender ingressar nesse mundo acadêmico das letras, ou mesmo os que já estão nele, e a qualquer um para quem a leitura seja algo significativo, especial. É sempre bom refletir sobre a maneira como fazemos aquilo que amamos! Boa leitura!

quinta-feira, maio 14, 2009

The Secret Mozart – mistérios do clavicórdio

The Secret Mozart é um título bastante sugestivo. Lembra-me muito algo como O Código da Vinci e coisas do gênero, mas não é disso que estamos falando. The Secret Mozart é um álbum que faz parte de uma série chamada The Secret Series, que apresenta obras de grandes compositores como Johann Sebastian Bach, Wolfgang Amadeus Mozart e George Friedrich Händel tocadas ao clavicórdio.

Mas o que haveria de misterioso ou secreto nesse instrumento? O clavicórdio é mais um dos avôs do piano, assim como o cravo. Parece ter tido bastante popularidade por volta dos séculos XVI até o XVIII, tendo como característica distintiva a possibilidade de permitir certas nuances de toque, mais suaves ou mais fortes, algo que o cravo não permitia. Contudo, tratava-se de um instrumento delicado, cuja potência sonora reduzida fazia com que seu uso fosse essencialmente doméstico, não destinado a apresentação em concertos ou para grandes públicos. Bach o considerava o instrumento mais adequado para o estudo, o entretenimento doméstico e o mais conveniente para a expressão de seus pensamentos musicais mais refinados.

 A nota de apresentação dessa coleção nos dá uma ideia da importância desse instrumento para os compositores da época:


O mais expressivo dos teclados – como Michael Praetorius descreve o clavicórdio em 1619 no “Fundamentum aller Clavirten Instrumenten”, – tem sido muito frequentemente apresentado como um instrumento de último recurso, em vez de ser a primeira escolha; porém, as evidências das casas de Bach e Mozart, de Händel, Haydn e até mesmo do jovem Beethoven é de que o clavicórdio era o teclado “normal”, enquanto que o cravo, mais alto, ou o mais novo piano-forte eram empregados pela necessidade dos grandes espaços públicos.


Assim, somos lançados de encontro ao mundo privado de cada compositor – no caso Mozart. Sua intimidade. Podendo ter uma delicada noção de sua genialidade e sensibilidade.

Há ainda algo de interessante nesse disco, ou mera curiosidade, é que algumas faixas foram gravadas em um instrumento que pertenceu ao próprio compositor e está atualmente no Mozarts Geburtshaus em Salzburg.

Com a performance de Christopher Hogwood e a participação de Derek Adlam, nos duetos; certamente essa gravação irá agradar ou até mesmo surpreender os fãs e admiradores do compositor austríaco, geralmente habituados a ouvir suas obras tocadas ao piano.

quarta-feira, maio 13, 2009

Mais sobre bonecos...

Aproveitando o tópico anterior, e o contato do Grupo Julietas e os Metabonecos, coloco abaixo dois links para páginas interessantes que eu encontrei sobre o assunto:

Blog do espetáculo Maria Farrar do Grupo Julietas e os Metabonecos

Site do espetáculo A trágica história do Doutor Fausto 

Blog Não mate o mensageiro

sábado, maio 09, 2009

Teatro de boneco para adultos – Por que não?

Estranho como algumas coisas, seja pelo destino ou por mera arbitrariedade, ficam marcadas como coisas para crianças. É o que acontece, por exemplo, quando qualquer elemento fantasioso entra em uma história ou ainda quando bonecos sobem ao palco. Mas por que isso acontece? Seria a realidade simulada mais adulta do que um assumido “faz de conta”?

Lembro-me que, ano passado, fui assistir a uma versão do Fausto do Christopher Marlowe feita como teatro de bonecos através de uma parceria entre a companhia Mariza Basso Teatro de Formas Animadas, o Teatro de LA Plaza e o Sesi. Embora todos os meios utilizados para divulgar o espetáculo tenham se preocupado em informar de que aquilo se tratava de um “teatro de boneco para adultos”, parece que a eficácia do alerta não foi suficiente. Dezenas de crianças corriam pelos corredores do teatro pouco antes de a sala se abrir... mas tudo bem. Com certeza, as crianças acharam tudo um máximo, principalmente os poucos palavrões e o pecado da luxúria, que subiu ao palco em forma de um pequeno demônio - o que certamente deve ter constrangido alguns dos pais.

De fato, há muito mais para se ver no teatro de bonecos do que se poderia em um primeiro momento pensar. Em primeiro lugar, não vejo muita diferença entre os tipos de histórias que se poderiam contar com bonecos e com atores normais. Pelo contrário, os bonecos abrem um novo universo a ser explorado que vai além da forma humana. Isto certamente é bem mostrado em A trágica história do Doutor Fausto. Além do próprio Fausto, sobem ao palco o Mefistófeles, diversos pequenos demônios, ao mesmo tempo cômicos e repugnantes; uma forma grande e assombrosa de Belzebu, além de outros efeitos só possíveis quando se abandonam as limitações do corpo humano.

Além da história e da poesia levadas ao palco através do texto, salta aos olhos uma boa dose de trabalho artístico na própria confecção dos bonecos, para não falar em sua habilidosa manipulação. Não há uma necessidade de que eles sejam “realistas”. Pelo contrário, às vezes, quanto mais se parecerem com bonecos, melhor será o efeito estético.

Esse é o caso do espetáculo O princípio do espanto, da Companhia Morpheus 12. Uma peça praticamente sem palavras, mas de grande sensibilidade, com apenas um ator/manipulador e um boneco, que não apresenta quaisquer marcas de individualidade. Sua cabeça é uma forma branca, apenas com saliências que indicariam a presença de olhos, nariz e boca. Em suas roupas, também, nada de distintivo. O ator, ao acender uma vela, dá início à peça e o boneco toma vida! Apaixona-se por si mesmo e, enfim, descobre o que de fato é. Sem palavras, ator e boneco transmitem toda uma série de sentimentos como vaidade, amor, medo e... o espanto.

Imaginar o espanto de descobrir qual é a sua própria natureza! É o encontro do boneco com seu manipulador. Como pensar em acariciar a face daquele que lhe dá a vida, os movimentos, as paixões... e, enfim, descobrir sua existência tão frágil quanto a chama de uma vela.

Por enquanto, não tenho mais nada a adicionar. Com certeza, A trágica história do Doutor Fausto e O princípio do espanto são dois espetáculos que valem a pena ser vistos.

Agora, leitor, se você chegou até aqui, então comente!

sábado, maio 02, 2009

Fábula

Essa história ficou por alguns meses em minha mente. Originalmente ela iria ocupar lugar em outro conjunto de histórias - ainda por serem inventadas - as quais chamaria de "Contos de além do horizonte". O que segue abaixo foi escrito rapidamente em uma sala de espera. Deve haver algum descuido com o português ou a métrica, mas no geral, acho que está razoável.

-Diz me o que você faz
que a torna especial -
diz o corvo a lamentar
- do alimento que preciso
não consigo chegar perto,
pois lá há sempre um vigia
de olhos e braços abertos
que muito medo me dá,
mais que a fome a me assombrar.
Mas você tem um abrigo
para proteger do frio
e da chuva que cair;
e é só sair no quintal,
que a comida estará lá,
deixada por um senhor,
nem bondoso, nem malvado,
pois é o mesmo que alimenta
e ampara o soldado,
que o lugar sempre vigia
onde meu sustento está.
-Não faz nada por bondade -
diz a orgulhosa galinha
- o senhor que me alimenta,
pois também a ele dou
meus ovos todos os dias.
Se a mim me dá comida,
faz porque sou importante
e manter-me sempre perto
é pr'á ele necessário.
Mas se você ele afasta,
com um soldado incansável
de certo será porque
você aqui nesse mundo
não passa de um inútil!

Foi-se o sol daquele dia,
e também de outros tantos,
e notou-se noutro mundo
cantoria e agitação.
Lá os homens preparavam
com a alegria que tinham
grande festa e banquete.
E a Lua e o Sol assistiram
a festa daquela gente.

Noutro dia um vazio
fez notar-se no quintal
e o corvo que ali chegara
estranhou o acontecido,
mas logo, logo entendeu
como era importante
a orgulhosa galinha
pra festa daquela gente.


Se você já leu até aqui, então comente!