quarta-feira, fevereiro 15, 2006

No banco da praça...

Esse é um texto feito como trabalho de conclusão de um curso de escrita de ficção, mas não foi entregue ao professor porque ele não apareceu para receber!

No banco da praça

Certa vez, enquanto esperava o ônibus, numa praça, pude ouvir esta interessantíssima conversa entre dois senhores, provavelmente, já aposentados. Um deles já estava bem careca, usava óculos escuros, uma camiseta branca, daquelas sem mangas, calças azuis e sandálias de couro que quase desapareciam sob as barras da calça. O outro ainda tinha muito cabelo, mas o mantinha impecavelmente aparado, usava bigode e uns óculos muito grandes; vestia uma camisa branca, já um tanto amarelada, usava uma bermuda marrom e, também, sandálias de couro, estas, porém, bem visíveis, pois não havia calça que as escondessem. E o homem de bigode começa a conversa:
- Tem feito calor, hein?
- É verdade... Dá vontade de não fazer nada – respondeu o outro com um jeito cansado. – Mas acho que logo chove...
- Chove... Mas larga mão de ser preguiçoso e faz alguma coisa!
- Ah! Mas eu já fiz muito! Servi o meu país!
- Ah, sim! – percebi um tom excessivamente irônico neste “Ah, sim!”, mas ele continuou – Olha, a gente sempre teve nossas divergências políticas. Lembra de como a gente se conheceu?
- Hahahaha! Mas depois que eu descobri quem você era... Eu nunca achei que você fosse bandido, mas me mandaram te prender! Só fiz o meu serviço.
- Passei um sufoco, viu? E agora, você tá satisfeito com seu país?
- Na verdade, não muito... Tem um monte de problema por aí...
- Problema!? Olha só o ponto de ônibus. Quanta gente! E essa merda, pelo jeito, deve tá atrasada. Daí, o ônibus vai cheio, lotado. E todo mundo de pé. Outro dia Fonseca, - assim se chamava o careca – tive que ir até o hospital, buscar uns exames. Tinha tanto velho no ônibus que se via um senhor de 65 cedendo lugar para o outro de 67. Sem falar do motorista que corria que nem louco. Foi uma dificuldade “pra gente” se equilibrar que só vendo...
- É Otacílio, - esse era o nome do de bigode – as coisas vão mal. No meu tempo...
- Que no meu tempo o quê! Só quero dizer, e você sabe muito bem, que não acredito nessa história de “meu país”... o que você fez foi proteger que tinha dinheiro... E professor que nem eu... Isso não tem nada a ver com pátria!
- Pô, amigo, depois de tanto tempo... Já te falei que eu fiz um monte de cagada na vida...
Então se fez um segundo de silêncio e constrangimento entre os dois. Logo o Fonseca voltou a falar:
- E o Palmeiras?
- Você viu, rapaz, perdeu de novo... desse jeito não dá...
- Acho que é culpa do técnico. Ele é muito burro!
- Você acha? Por o L... pra jogar! O cara é o maior perna de pau! E ainda joga de salto alto! Imagina!... Quem o Palmeiras pega na próxima rodada?
- Acho que é o São Paulo...
- Ih! Tá f...
Então, finalmente o ônibus chegou e tive que ir embora. Foi interessante descobrir, por acaso, como eles se conheceram. Apesar disso, não existe raiva ou rancor. Restou apenas a companhia um do outro, a amizade e suas intermináveis conversas tão inconclusivas quanto a vida...

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